Mortes memorizadas nos Caminhos do Cinema Português

IMG 2418 2Ensaio sobre a mor­te”, “Equi­nó­cio”, “Os Mor­tos” e “Bos­to­frio, oú le ciel rejoint la ter­re” foram os fil­mes que mar­ca­ram lugar na tela do Tea­tro Aca­dé­mi­co de Gil Vicen­te (TAGV), dia 28, pelas 17H30. Na pla­teia esti­ve­ram a atriz do segun­do fil­me, Alba Bap­tis­ta, e o rea­li­za­dor da ter­cei­ra exi­bi­ção, Gon­ça­lo Robalo.
Num sen­ti­do vas­to e comum, os fil­mes foca­ram a pro­ble­má­ti­ca da mor­te ali­a­da à memó­ria, numa rela­ção rela­ti­va­men­te estrei­ta. As ques­tões de iden­ti­da­de – de onde vimos? onde tudo come­ça e aca­ba? o que vem a seguir? – foram tam­bém tra­ta­das nas duas horas de exibições.
Mar­ga­ri­da Madei­ra no “Ensaio sobre a mor­te” expla­na a his­tó­ria de alguém que teme o des­co­nhe­ci­do e a apro­xi­ma­ção à mor­te. Num envol­vi­men­to dinâ­mi­co, trans­por­ta o espe­ta­dor para o dile­ma da per­da de iden­ti­da­de da per­so­na­gem que apre­sen­ta. Com recur­so à com­pa­ra­ção a um jogo de tetris, a rea­li­za­do­ra mos­tra o per­cur­so tur­bu­len­to daque­le alguém que mui­tas vezes se apro­xi­ma de uma espé­cie de pre­ci­pí­cio ou, sim­pli­fi­can­do, de uma “peça” sem saída.
A per­da da iden­ti­da­de con­ti­nu­ou a ser pon­to de foca­gem no “Equi­nó­cio”, de Ivo Fer­rei­ra, que remon­ta à região da ilha do Farol, onde mui­tas habi­ta­ções foram der­ru­ba­das, de for­ma a devol­ver à Ria For­mo­sa a sua natu­re­za. Aqui ficam no ar as ques­tões das his­tó­ri­as, das memó­ri­as e das iden­ti­da­des daque­las pes­so­as que aban­do­na­ram o local a que per­ten­ce­ram. Ausen­te de diá­lo­gos, o fil­me colo­ca o espe­ta­dor numa posi­ção de obser­va­dor par­ti­ci­pan­te, uma vez que obri­ga a puxar pelos sen­ti­men­tos, que o con­jun­to de ima­gens nos faz transpirar.
Não menos envol­ven­te foi “Os Mor­tos”, de Gon­ça­lo Roba­lo. Um fil­me com­pos­to ape­nas por ima­gens está­ti­cas que vão anun­ci­an­do a mor­te das pes­so­as que tive­ram peso na vida do rea­li­za­dor. Um fun­do pre­to, com datas de cor bran­ca mar­ca as pas­sa­gens entre as diver­sas caras que vamos ven­do e conhe­cen­do ao lon­go do fil­me. As pas­sa­gens, pau­sa­das, dei­xam espa­ço para que o espe­ta­dor refli­ta sobre a pro­ble­má­ti­ca da mor­te e, ao mes­mo tem­po, se envol­va e até se iden­ti­fi­que com os sen­ti­men­tos de per­da e apro­xi­ma­ção à mor­te do realizador.
A últi­ma mos­tra ficou a car­go do fil­me “Bos­to­frio, oú le ciel rejoint la ter­re”, de Pau­lo Car­nei­ro. De um modo sim­ples, a lon­ga-metra­gem tra­ta a his­tó­ria de um jovem rea­li­za­dor ruma a uma aldeia no inte­ri­or de Por­tu­gal para conhe­cer de per­to a his­tó­ria dos seus avós. A mor­te, o des­co­nhe­ci­men­to da ver­da­dei­ra iden­ti­da­de e as memó­ri­as que vai desen­ter­ran­do entre con­ver­sas com des­co­nhe­ci­dos mar­cam a lon­ga jor­na­da pela bus­ca da ver­da­dei­ra origem.
Uma tar­de mar­ca­da pela repre­sen­ta­ção do sen­ti­men­to de per­da: não só o medo de per­der aqui­lo que somos, mas tam­bém o medo da apro­xi­ma­ção à mor­te – esta que aca­ba por ser o úni­co fim a que esta­mos asser­ti­va­men­te des­ti­na­dos, como faz ques­tão de mar­car Gon­ça­lo Roba­lo no final do filme.

Rita Fer­rei­ra

Sai­ba mais na seguin­te liga­ção: Mor­tes memo­ri­za­das nos Cami­nhos do Cine­ma Por­tu­guês.