É o sentimento de responsabilidade que motiva Avi Mograbi, cineasta judeu israelita, ativista e crítico da ocupação dos Territórios Palestinianos no seu compromisso com a defesa dos direitos humanos e com a justiça social. O Centro de Estudos Cinematográficos da Associação Académica de Coimbra, com o apoio da Queima das Fitas, apresenta um ciclo dedicado à obra do cineasta, testemunho fundamental da ocupação israelita e da situação hoje vivida na Palestina. Acontece ao longo do mês de Junho na Casa do Cinema de Coimbra e no Auditório Salgado Zenha, com projeções comentadas e com a presença de Avi Mograbi, na última sessão.
O ciclo atravessa a obra do realizador, desde “Happy Birthday, Mr. Mograbi” (1999), exibido no dia 10 junho, que retrata as celebrações dos 50 anos do estado de Israel, a par com uma onde de despejos de palestinianos, situação vivida pelo próprio, na possibilidade de perder a sua casa; a “Once I Entered a Garden” (2012) que se movimenta entre as identidades que fluem naqueles territórios — árabe e judia, ao mesmo tempo que as questiona na relação com aqueles lugares. Exibidos nos dias 17 e 24 junho, respetivamente, “Avenge but one of my two eyes” (2005) e “The First 54 Years: An Abbreviated Manual for Military Occupation” (2021) são as obras que mergulham na realidade da ocupação militar israelita em território palestiniano, e na opressão, humilhação e violência que esta ali impõe.
Mais do que a prática do cinema, a Mograbi, interessa-lhe gerar debate público que confronte os discursos hegemónicos. Com a sua típica ironia, considera-se uma “mosca na sopa”.
10 junho, 21:30
casa do cinema de coimbra
Happy Birthday, Mr. Mograbi
1999 — França, Israel — 77′
1998. Israel completa cinquenta anos. Mograbi é contratado pela televisão israelita para documentar inúmeras celebrações luxuosas do aniversário da nação. Ao mesmo tempo, um veterano produtor de televisão palestiniano, Daoud Kutaub, contrata‑o para documentar uma onda de despejos de palestinianos. Entretanto, Mograbi enfrenta a perspectiva de perder a sua própria casa. O cineasta vira obsessivamente a câmara para si mesmo enquanto tenta desesperadamente dar sentido à sua vida emaranhada.
13 junho, 18:30
auditório salgado zenha
Once I Entered a Garden
2012 — Israel, França, Suíça — 100′
Começa com um sonho sobre um encontro impossível entre Avi Mograbi e seu avô, Ibrahim, fora de sua casa em Damasco, em 1920. Que língua falavam? O árabe de Avi é rudimentar, enquanto Ibrahim ainda não tinha aprendido hebraico. Para dar vida ao seu sonho, Avi recorre ao seu professor de árabe e bom amigo, Ali Al-Azhari, e sugere que façam um filme juntos “até o último toque”, como diz Ali. No estilo típico de Mograbi, o cineasta entrelaça uma narrativa sobre cinema com o próprio filme, um filme sobre identidade que questiona os nossos pressupostos básicos sobre o que nos torna quem somos.
17 junho, 21:30
casa do cinema de coimbra
Avenge But One of My Two Eyes
2005 — França, Israel — 104′
A partir dos mitos de Sansão e Massada, as gerações mais jovens de Israel aprendem que a morte é preferível à dominação. Hoje, enquanto se desenrola a segunda Intifada, os palestinianos são constantemente humilhados pelo exército israelita – os camponeses são impedidos de arar os seus campos, as crianças que regressam da escola ficam presas em postos de controlo durante horas, uma mulher idosa não consegue nem regressar casa… Exaustas, estas pessoas expressam a sua raiva e desespero – tal como os Judeus fizeram com os Romanos ou Sansão com os Filisteus. Lugares, tempos e situações reais penetram-se e integram-se, apresentando a realidade israelita tal como ela é: complicada, violenta, suicida.
sessão comentada pela Secção de Defesa dos Direitos Humanos da AAC
24 junho, 21:30
casa do cinema de coimbra
The First 54 Years: An Abbreviated Manual for Military Occupation
2021 — França, Finlândia, Alemanha, Israel — 108′
Um guia para a ocupação militar tendo como exemplo paradigmático a ocupação israelita dos territórios palestinianos na Cisjordânia e na Faixa da Gaza. Testemunhos de soldados israelitas dão uma perspetiva da história da ocupação e das suas rotinas quotidianas.
com a presença do realizador Avi Mograbi e conversa com Teresa Almeida Cravo (Investigadora no Centro de Estudos Sociais da UC)
Fotografias por Gabriel Quelhas
No passado dia 24 de junho na CCC (Casa do Cinema de Coimbra) encerramos o ciclo de cinema promovido pelo CEC (Centro de Estudos Cinematográficos) “Avi Mograbi: Uma mosca na Sopa”, que reunia alguns filmes do realizador judeu israelita, Avi Mograbi.
O filme que encerrou o ciclo foi o “The First 54 Years An Abbreviated For Military Occupation”, um filme que retrata a ocupação dos territórios palestinianos na Cisjordânia e na Faixa de Gaza, a partir de testemunhos de ex-militares israelitas. Com a presença do realizador na sessão conseguimos ter uma conversa com o próprio no final da sessão. Avi começa por dizer que “este filme é uma ótima compilação do método e mecanismos que irá lidar a próxima erupção” (…) “a parte final do filme é para onde caminhamos, esta sequência é uma atitude. Isto é como Israel pensava em Gaza antes de outubro e aqui não há palavras de esperança.”.
Quando interrogado por Teresa Almeida Cravo (Investigadora no Centro de Estudos Sociais da UC) “Porque é que não existem testemunhas de mulheres no seu filme?” o realizador afirma que “Ambos homens e mulheres servem no exército de Israel, e nas imagens de arquivo que usamos aqui havia de facto isso, mas o importante em ter em consideração é que as mulheres até há cerca de 15 anos não estavam na linha da frente, mas sim nos serviços administrativos. Havia até uma testemunha neste filme que não chegou ao último cut do filme, pois parecia um pouco desconexo da temática que o filme aborda”. “A parte mais triste da história é o que não percebemos, nos recusámos a entender, e nos estamos condenados a compreender” diz Mograbi. Quando questionado sobre qual era a sua audiência, Mograbi, de modo sarcástico, começa a contar quantas pessoas estavam na sala.
O realizador, escritor, montador e ator do filme disse ainda que não conseguiu visibilidade nos festivais de cinema de Israel, pois o seu filme foi recusado em todos. Acrescenta ainda que a audiência dos filmes dele não se encontra em Israel, mas na Europa.
Para quem não os conseguiu ver na Casa do Cenma de Coimbra e no Auditório Salgado Zenha, o realizador disponibilizou alguns dos seus filmes no seu canal de Youtube e Facebook, para que possam ser vistos e partilhados livremente, enquanto se informam cada vez mais pessoas.
Texto por Guilherme Paiva
Ciclo realizado no âmbito dos apoios a projectos culturais da Queima das Fitas 2024.
Bilhetes sócios CEC 2€